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Economia comportamental e um mundo de melhores decisões

Eu, você e a sociedade em geral temos uma visão bastante otimista da natureza humana: acreditamos que somos perfeitamente racionais, que temos capacidade ilimitada de processamento de informação e que somos ótimos em fazer planejamentos de longo prazo e agir consistentemente.

Basicamente, nessa visão, a grande maioria das pessoas teria o raciocínio lógico desse cara aqui:

Ou a força de vontade desse aqui:

“And I think to myself… What a wonderful world!” Né?! As pessoas não se endividariam, não se deixariam levar pelas emoções e só comprariam o que realmente é útil para elas. Não teriam problemas com peso ou qualquer hábito indesejável. Mas esse mundo não parece muito real.

As pessoas desejam ter uma alimentação saudável, se exercitar com frequência, parar de beber ou fumar. Planejam economizar mais, ter hábitos sustentáveis. Mas, muitas vezes, não conseguem agir de acordo com suas intenções.

Por que agimos de maneiras que não condizem com os nossos interesses de longo prazo?

Será que somos tão racionais assim?

A dinâmica do mercado em que vivemos não nos ajuda a superar as tentações e a pensar no futuro. Por isso, para entender como o nosso “sistema operacional” realmente funciona no intuito de criar ambientes que encorajam a tomada de melhores decisões, existe o trabalho da Economia Comportamental. Ela incorpora contribuições do campo da psicologia e da neurociência à economia, estudando as influências cognitivas, sociais e emocionais nas nossas escolhas. 

Somos previsivelmente irracionais

Pelo menos é assim que o economista comportamental Dan Ariely nos define.

O que ele quer dizer com isso é que indivíduos desviam seus comportamentos, sendo influenciados por atalhos e regras de bolso que minimizam os esforços mentais necessários na tomada de decisão. Isso gera comportamentos previsíveis que independem de cultura ou classe social, pois são inerentes à nossa natureza.

“Se entendermos verdadeiramente as limitações humanas e projetarmos o mundo com base nessa noção, teremos produtos e mercados que serão muito mais compatíveis com nossa capacidade humana e que nos permitirão, por fim, prosperar.” (Dan Ariely, Guia de Economia Comportamental e Experimental, 2015).

Esses vieses cognitivos e heurísticos, como são chamados na Economia Comportamental, são essenciais para que possamos compreender o comportamento humano e as motivações por trás dele. Quer saber um pouco mais sobre alguns deles?

Status quo

Temos a tendência de deixar as coisas como estão, de nos mantermos inertes, mesmo que as mudanças nos tragam melhores resultados. Sabe aquela internet que só dá problema, o plano de celular que é antigo e caro, a TV a cabo que você quase não vê ou aquele jornal que você nem lê, mas, apesar disso, mantém as assinaturas? Então, é isso.

Sobrecarga de escolha

Muitas opções sobrecarregam nosso esforço cognitivo e tornam a decisão mais difícil. Aquela máxima vale para quase tudo: menos é mais. Já foi num restaurante com um cardápio enorme, com umas 80 opções, e você não consegue escolher?! Acabamos pedindo “o de sempre, por favor” ou a sugestão da casa.

Aversão à perda

Somos mais afetados pelas perdas do que pelos ganhos. Nossa aversão à perda nos leva, entre outras coisas, a gastar cada vez mais dinheiro em jogos, ter dificuldade de vender um imóvel por um valor menor do que pagamos e o mais comum “Comprei porque não podia perder o desconto, né?”.

Benefício agora

Preferimos uma recompensa menor, mas agora, do que uma maior no futuro. Ou seja, quase sempre optamos pela gratificação imediata. A tentação de viajar e comprar coisas, combinadas com a facilidade de usar o cartão de crédito são difíceis de resistir e acabamos não economizando para coisas importantes no futuro, como aposentadoria.

Normas sociais

Olhamos para o comportamento dos outros para tomar as nossas próprias decisões. Temos a tendência de conformar com o grupo no qual estamos inseridos e buscamos constante aprovação. Conferir se todo mundo vai naquela festa antes de comprar o ingresso, ou ver o seriado que está todo mundo assistindo são bons exemplos de como normas sociais influenciam nossas escolhas.

A contribuição da Economia Comportamental

Reconhecendo que nossas escolhas, muitas vezes, se afastam da racionalidade, a Economia Comportamental sugere que os ambientes sejam projetados na tentativa de guiar as pessoas em uma direção que fará suas vidas melhores.

Sabe aquele leve empurrãozinho que precisamos para fazer uma escolha que faríamos se não fôssemos influenciados pelo contexto? Então, na Economia Comportamental ele é também chamado de nudge.

“Nudge é qualquer aspecto da arquitetura de escolha que altera o comportamento das pessoas de maneira previsível, sem proibir quaisquer opções, nem mudar significativamente os incentivos econômicos.”  (Tradução livre – Nudge: Improving decisions about health, wealth and happiness, 2008)

Saber que muitas opções, na verdade, atrapalham a escolha nos leva a duas estratégias comportamentais (nudges) possíveis: ou trabalhamos com um número menor de opções ou estruturamos as escolhas dos nossos clientes para que os esforços cognitivos sejam poupados e a venda aconteça de maneira fluida, sem atritos.

Sabe quem faz isso muito bem? A Amazon, pois entendeu que ajudar os seus consumidores estruturando suas escolhas conforme o perfil de cada um simplificaria o processo de compra, a simpatia e satisfação com relação a marca indiretamente aumentariam.

Entender que temos tendência de nos manter inertes nos faz pensar em criarmos opções padrões que sejam de maior interesse para nosso target e também para a sociedade em geral. Foi assim que a doação de órgãos aumentou em muitos países da Europa (veja esse estudo)Apenas mudando a forma como o formulário era apresentado, de “marque aqui se você quer ser um doador de órgãos”, para “marque aqui se você não quer ser um doador de órgãos”, os países que se adequaram a este modelo fizeram do nosso comportamento inerte um meio para alcançar os resultados desejados e salvar muitas vidas.

Mas nós também podemos criar defaults no nosso dia a dia e nos negócios. Tanto é possível que surgiu na Aldeia o Do It Today, um projeto em que a Tribo pode vivenciar na prática como funciona a aplicação dos diversos nudges da Economia Comportamental. Literalmente, aquele empurrãozinho para os que costumam procrastinar.

Mais simples do que imaginamos, né?

Quando compreendemos que olhamos para os outros para tomar nossas próprias decisões, a conclusão é de que podemos fazer as pessoas se compararem por coisas boas também! Podemos, por exemplo, criar nudges que encorajem as pessoas a ter comportamentos sustentáveis (1), não cometer atos de violência (2), a se exercitar (3) e até a fazer o upgrade do sistema do computador (4), salientando que a maioria das pessoas assim o fazem.

Já parou para pensar como você pode aplicar essas contribuições da Economia Comportamental na sua vida e nos negócios? Acredite: é mais simples do que parece. Pequenas mudanças podem sim gerar grandes resultados.