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Profissional bom de tecnologia é aquele que resolve grandes tretas: entenda por quê

Se você tem ou trabalha para alguma startup ou simplesmente tem um projeto de tecnologia nas suas mãos, já deve ter se deparado com um dos grandes problemas desse mercado: a contratação de profissionais de tecnologia. Eu diria que a raiz do problema não é tanto a quantidade de profissionais, afinal há alguns anos os pais, avós e tios falaram para todos os mais novos que “informática era a profissão do futuro”. Seguindo esse embalo, muitos partiram para esta linha mesmo gostando de biologia ou de artes plásticas, mas, querendo garantir um espaço no “mercado do futuro”, acabaram fazendo cursos superiores na área de TI.

Startups x meio corporativo

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Outro ponto importante é que, na sua grande maioria, as faculdades formam profissionais para trabalhar em corporações, não em modelos dinâmicos (como o de startups). Quem está nesse meio sabe que o senso criativo e organizacional de startups é totalmente diferente do mercado corporativo de grande porte. Em linhas gerais, o mercado corporativo pede “se está funcionando, não mexa” enquanto as startups pregam “mexa para funcionar de forma inovadora e diferente o mais rápido possível”. Empreender em grandes corporações é uma tarefa tão ingrata quanto vender areia no deserto. Não é impossível, apenas muito difícil.

O que é ser bom de verdade?

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Recebemos uma carga muito grande de profissionais que não têm vocação ou simplesmente paixão pelo que fazem. Tenho mais de 20 anos de vivência tecnológica trabalhando com profissionais de todos os níveis em projetos de portes tão vastos quanto. O que posso garantir é que se eu conseguir listar um “fora de série” por ano de trabalho, estarei sendo generoso. Cada vez mais os currículos ficam mais recheados de termos da moda: duas ou três linguagens, experiências com quatro tipos de bancos de dados, vários frameworks, web, mobile, xbox, ps4, arduino, linux, freebsd, design thinking, github, svn, cvs… todo mundo diz que sabe tudo.

Quando participo de seleções de profissionais, é normal eu receber currículos de pessoas de 22, 23 anos buscando um cargo de “Desenvolvedor Sênior”. Não que isso não seja possível, mas a senioridade neste mercado não se resume a conhecer três linguagens ou quatro frameworks. Senioridade é medida pelo tamanho do problema que você resolve. Entenda aí como “problema” questões técnicas, financeiras, administrativas e, principalmente, políticas. Sim, senioridade é poder entrar numa reunião com vários pontos de vista contrários e defender o seu com maestria. E, convenhamos que pra chegar nesse ponto, é necessário ter percorrido uma longa estrada ou, no mínimo, possuir um dom extraordinário.

Salários

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Quando se falam nos salários dessa área, existe também uma grande distorção. É comum vermos no Facebook ou no Twitter pessoas zombando de vagas pedindo tudo aquilo que mencionei antes e oferecendo “mil e quinhentos, mil e seiscentos reais”. Lógico que é uma ofensa! Mas é um retrato não apenas da deficiência de quem contrata, mas de uma supervalorização técnica dos candidatos. Selecionar gente boa não é fácil. Gente boa ganha bem, mas não pelas 10 tecnologias que conhece, e sim, reitero, pelo tamanho do problema ou da “treta” que resolve.

Outro ponto é que a diversidade de combinações entre linguagens, frameworks, bancos de dados, sistemas operacionais envolvidos é tão grande que cada projeto chega quase a ter uma combinação exclusiva, o que torna o trabalho de headhunters ou agências de RH cada vez mais difícil. Contratações exigem que você envolva seu próprio time de tecnologia para uma avaliação menos arriscada e mais voltada ao projeto.

Brasil x Estados Unidos

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Quase sempre pensamos que a realidade é apenas um retrato do mercado brasileiro. De fato, temos peculiaridades aqui que favorecem alguns tipos de comportamento, principalmente porque a CLT é um assunto complexo e, na minha opinião, dificulta partirmos para modelos mais ousados. No último ano passei algum tempo nos Estados Unidos conversando com empreendedores, aceleradoras, head hunters, universitários e profissionais de tecnologia. Por lá a concorrência por bons profissionais é ainda maior do que aqui, mas a grande diferença está no modelo de contratação.

Lá o engajamento e identificação pessoal com o projeto são ainda maiores. Ao receber uma oferta, não se pensa necessariamente só em dinheiro, mas principalmente no equity que a empresa oferece, no crescimento interno e em quanto o profissional tem a capacidade de empreender com aquele time que está lhe fazendo uma oferta. Outro ponto é a relação pouco protecionista trabalho x emprego. Não tem FGTS, décimo terceiro, multa rescisória. Se você não performar, no outro dia está na rua. Se você é um bom profissional num mercado aquecido, no outro dia já estará empregado de novo caso tenha havido qualquer distorção da avaliação da sua performance.

Quem é dono de uma startup ou de qualquer negócio que envolva tecnologia sabe que fazer um modelo parecido nas terras tupiniquins é algo extremamente complexo e arriscado. Se seu projeto não der certo, provavelmente você terá um grande passivo trabalhista para encarar que muitas vezes arrasa sua vida. A cultura do “trabalhador” aqui pergunta primeiro sobre salário e benefícios que viram dinheiro (VT, VR, Combustível, etc), porque é o que dá a pseudo-segurança que fomos educados a buscar.

Conclusão: resolva grandes tretas

Você, que é um bom profissional, deve estar lembrando de quantas ofertas já teve para empreender, mas muitas vezes isso exigia além do seu capital intelectual ou um grande investimento financeiro, o que nem sempre é possível. Saiba que trabalho nunca vai faltar, afinal você resolve “grandes tretas”.

Mas se seu desejo é empreender, procure se espelhar nos modelos lá de fora e busque um projeto pelo qual você se apaixone e com o qual se identifique de verdade. Buscar um equity crescente de acordo com os resultados que você entrega é algo que, além de evidenciar sua dedicação ao projeto, mostra confiança na sua habilidade técnica.

“Posso empreender mesmo sem ter equity?” Pode! Usar isso como aprendizado para, em outro momento criar o próprio negócio, ou até mesmo ficar como “empregado” para vida toda é algo válido, mas tenha como missão para sua profissãoresolver grandes tretas” e não simplesmente conhecer 5 diferentes linguagens. É disso que o mercado precisa! Conto com vocês pra virar esse jogo.

Quer saber mais? Olha só esses indicadores do Vale do Silício.